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A PAISAGEM É
Fernanda Fragateiro


Paisagem Cultural de Sistelo / Arcos de Valdevez

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Para a artista, o valor da paisagem enquanto propriedade, bem como o valor poético e simbólico da paisagem enquanto valor cultural foram importantes pontos de partida. No final,  o  convite para olhar a vista é uma sugestão para olhar para nada – ou melhor – para olhar o ver, para embarcarmos numa espécie de perceção e consciência do espaço. Sabe-se que o uso da paisagem mudou e mudará ao longo dos tempos; e que existem terras nestas paisagens. Olhar a paisagem afasta-nos, assim, do particular de cada uma dessas terras e faz-nos ver dentro do grande horizonte espacial. Faz-nos ver um todo. Também o direito à paisagem é o direito do uso da paisagem, a defesa do seu uso pela comunidade e isso faz-se através do direito à passagem, à caminhada e não só ao olhar, atividade que este projeto também quer promover. Fernanda Fragateiro procurou “desenhar espaços de liberdade”, o que está em absoluta continuidade com o núcleo do que sempre lhe interessou no espaço. Se a autora tivesse de indicar em poucas palavras o que julga ter compreendido sobre o espaço, diria que a possibilidade da experiência e da abertura do pressentimento da liberdade é essencial em cada lugar. “Direito ao tempo” e “direito ao espaço” (que não são senão dois modos de declinar os nomes da liberdade).
A intervenção abre, pois, um espaço semântico na paisagem, que é compreendida a partir do conhecimento que temos da natureza e da forma como a transformamos tal como da construção da paisagem enquanto fenómeno cultural. A compreensão desta não pode ser entendida de forma fragmentada, mas através do seu todo, daí a decisão de se contemplar uma grande parte do território para a instalação das bandeiras, que marcam lugares, mas também estabelecem relação entre diversos e diferenciados espaços. A ideia de usar texto, frases retiradas de poemas, tem a ver com o facto de os poetas serem, talvez, os verdadeiros proprietários do horizonte. Os poetas integram, através do seu olhar, todas as partes da paisagem. Fernanda Fragateiro quis, com a introdução do texto, construir um guia poético para “atravessar” território e paisagem. Para além das palavras que escolheu, citou frases de Gonçalo M. Tavares, Maria Gabriela Llansol, W.J.T. Mitchell, Bernardo Soares e Ralph Waldo Emerson. Pode este texto, feito de muitos textos, ser memória e antecipação? É certamente um veículo de comunicação entre o que observa e o que é observado.


Material
Mastros em pvc e bandeiras em tecido 100% polyester com impressão digital.
Dimensões
10 m (mastro) + 1.8 x 2.55 m (bandeira).



Cadernos de visita, primeiros esboços da implantação das bandeiras. © António Jorge Silva



Ato inaugural em Novembro de 2018
SOBRE A AUTORA

Fernanda Fragateiro desenvolve um trabalho fortemente interessado em práticas artísticas e arquitetónicas da vanguarda do século XX. O seu contributo reconhece-se sobretudo pela interdisciplinaridade, onde áreas como a escultura, a instalação, a cerâmica, a arquitetura, o design ou a ilustração se cruzam em obras que dialogam com o espaço onde se inserem e com o espetador que, muitas vezes, é convocado para uma ação performativa que completa a obra.  Expôs individualmente pela primeira vez em 1987 e, desde então, tem participado em várias exposições individuais e coletivas em Portugal e no estrangeiro, destacando-se Joint is Out of Time, na Galleria Nazionale d’Arte Moderna e Contemporanea de Roma (2019, 2017), Processo, no Museu Internacional de Escultura Contemporânea de Santo Tirso (2018), Fernanda Fragateiro: dos arquivos, à matéria, à construção, no Museu de Arte, Arquitectura e Tecnologia (Lisboa, 2017), The Way We Live Now no Carpenter Center for the Visual Arts, Harvard University (Cambridge, 2015) e Beyond the Supersquare no Bronx Museum (Nova Iorque, 2014).

www.fernandafragateiro.com


SOBRE O LUGAR

Sistelo é um lugar marcante envolvido pela ancestralidade dos socalcos, ex-líbris da povoação e símbolo do convívio secular entre Homem e Natureza. Estas “escadas verticais”, além do encanto com que esculpem a paisagem, representam a forma inteligente e eco sustentada de obter provento agrícola e pecuário, sendo palco para a criação das raças autóctones de vacas Cachena e Barrosã.
A zona central da povoação guarda igualmente uma forte memória dos ritmos de outrora, com um núcleo de espigueiros, uma fonte e casario típico e a singular e misteriosa Casa do Castelo de Sistelo. Este lugar com uma marca identitária única em Portugal, e apelidado de “o pequeno Tibete português”, foi o vencedor nacional das 7 Maravilhas de Portugal, na categoria de Aldeia Rural. A excecionalidade e elevado valor patrimonial de Sistelo coroaram-no ainda como “Paisagem Cultural”, na forma de Monumento Nacional/Sítio de Interesse Nacional, a primeira do seu género em Portugal.
Paisagem Cultural de Sistelo – Monumento Nacional


Implantação das bandeiras